Desculpa se te chamo de amor...

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Príncipe.



Eu sigo sem saber em qual ponto você peca em ser tão deus. Paro, olho, analiso e nada. Revejo seus atos, todas as coisas que você faz e nada. Talvez você peque um pouco no fato de não acreditar no amor, em empurrar relações com a barriga mas, até aí, a maioria das pessoas vive assim, portanto, isso não te faz menos príncipe.

Você não é da realeza mas tem atitudes de uma nobreza sem fim. Ela não é, nem de perto, algo que chegue aos seus pés, mas por algum motivo irônico na vida, é ela quem tem a realeza como companhia.

Ouvi dizer que ela não dá o valor merecido à isso, assim como sua ex-mulher também não deu, o que realmente me deixa pasma. Quão imbecil uma pessoa tem que ser, pra não respeitar, amar e se orgulhar de alguém que faz parte não da realeza da Espanha, Dinamarca, ou Inglaterra, e sim, da minha realeza? Quão imbecil uma pessoa tem que ser, pra não achar que você com certeza nasceu no país errado, pra não querer passear de mãos dadas com você e com o peito estufado e o maior sorriso no rosto, como quem diz: ”olhem, podem olhar. Eu fiz por merecer o meu príncipe”?

Eu não te conheço, o máximo que nós conseguimos manter de conversa foi algo besta e que, provavelmente você não lembra ou por que foi insignificante, ou por que sua timidez apagou da sua memória, mas eu posso afirmar com todas as letras: príncipe.

Juro que nunca entenderei a lógica de uma mulher ter quebrado seu coração em milhões de pedaços e a outra não reconhecer o quanto é sortuda por ter você ao lado dela.

Você não é da realeza, elas não são princesas e eu sigo procurando entender qual o mistério que cerca tudo isso e que te faz parecer tão príncipe apesar de ter o português como sua primeira língua, não ter sangue azul e deixar qualquer reles plebéia que não te dá valor se aproximar, enquanto eu fico aqui, admirando a realeza de longe.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

O bem que você me fez.



Foi estranha a sensação que eu tive ontem, quando te vi. Não foi a ansiedade de antes, nem o nada que eu pensei que seria. Não vou mentir pra você que meu coração não bateu uns três décimos a mais quando a campainha tocou. Um mês sem te ver e foi exatamente isso que aconteceu. Mas logo ele voltou ao normal e meu pensamento passou longe da sala de espera, que era aonde você estava. Pela primeira vez nesses meses todos, sua presença há alguns metros de mim não fez com que eu perdesse o foco.
Quando eu estava levantando pra ir embora, me passou pela cabeça que eu poderia dar uma olhada na minha aparência antes de sair pela porta ou que, talvez, eu pudesse simplesmente, ser mais bonita, mas esse pensamento não durou nem um minuto.
E então, a porta se abriu, e lá estava você – hoje, eu diria, que você parecia relaxado. Você estava sentado relaxado, calmo – e eu juro que me preparei pro turbilhão de estranhas emoções que você sempre teve a facilidade de causar mesmo sem saber, prendi minha respiração quando meu olhar encontrou o seu e, inconscientemente, esperei. Esperei minhas pupilas dilatarem, esperei meu coração acelerar, esperei minhas mãos suarem. Mas não, não teve nada. Silêncio. Acho que foi a primeira vez que meu sorriso saiu sem ser algo ensaiado durante horas na minha cabeça, e acho que foi a primeira vez que eu senti simplesmente calma, ao estar frente a frente com você. Não que antes você não me passasse calma, muito pelo contrário – essa sempre foi uma das mais fáceis qualidades sua, mesmo sem você se quer ter noção disso. Mas hoje, hoje foi diferente. Hoje eu não fui até o ponto mais alto do céu, e voltei. Hoje, parece que eu fiquei nas nuvens. Parece que você estava nas nuvens.
Saí de lá com uma paz imensa. Poderia sim, dizer que eu estava me sentindo naquele jeito por estar acabando de sair da terapia e que a paz que eu estava sentindo é por que sempre saio de lá achando que tudo vai acabar bem. Esse tipo de paz eu sinto sempre, todas as quintas-feiras da semana. Mas ontem, eu tive a sensação de tranqüilidade, de estabilidade. A única tranqüilidade que você tinha me oferecido, até então, aconteceram nas minhas noites de pânico total, de choro total, de síndrome do pânico total, de breu total. E a estabilidade, seria algo que você só poderia me dar, se nós nos conhecêssemos. Mas ontem, por aqueles milésimos de segundo e até algumas horas depois, eu me senti estável, tranqüila, segura, feliz. E alguma coisa me diz que foi a sua presença ali, que causou tudo isso. Sem mais todo aquele melodrama de antes, sem o sofrimento de depois. Somente calma.
Mas, por favor, não pense que na minha cabeça não se formam mais idéias dessas que parecem filmes, da minha vida cruzando com a sua em algum mercado, shopping, rua. Por que isso ainda acontece. Porém, no momento, tudo o que eu realmente queria, era ficar sentada, olhando no fundo dos seus olhos, e tentando pegar o máximo da paz que você arranjou em algum lugar nesse um mês que eu fiquei sem te ver, pra guardar pra mim. Se eu não posso te ter, não seria tão egoísta assim, da minha parte, ter pra mim um pouquinho só dessa sua paz instantânea.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Mofo.



Passei anos, longos anos da minha vida, lutando por você, lutando por memórias de você, lutando por fantasias de você, lutando contra você. Não lembro da minha vida antes de você, por que você se fazia presente mesmo quando eu ainda era um bebê – e você, por mais estúpido que seja, deve deduzir que bebês não retém memórias. É impossível, pra mim, lembrar do meu passado, sem ter alguma marca sua, por menor que seja, nele. Eu odeio reviver meu passado. Minha infância, minha pré-adolescência e até lá pros meus 17 anos, são coisas que eu não gosto de tirar de dentro da caixa que está em cima do armário mais alto que eu achei dentro de mim. Tenho alergia ao mofo, ao velho.
Lembro de quando eu era muito, mas muito pequena mesmo, talvez uns 4, 5 anos, e meu “namoradinho”, naquela época, não era nenhum coleguinha meu da escola. Era você. Eu me orgulhava de ser você. Aos 6, nos separaram por que nos pegaram fazendo coisas que os outros julgavam como erradas, para duas pessoinhas da nossa idade – eu com seis, e você com 10 – e para o nosso grau de parentesco. Dos três anos que eu fiquei sem te ver, jurava de pé juntos que não, já tinha passado. Mal lembrava de você, estava mais preocupada em passar de ano em matemática, do que saber se eu ainda tinha algum espaço dentro de você. Até o maldito dia que a gente voltou a se encontrar, no natal, na casa da nossa avó. Ali eu soube que não importava o que acontecia: eu estaria extremamente ferrada pelo o que eu julgava estar morto dentro de mim, por bons anos da minha vida. Nossa relação não era mais a mesma, agora exista muito medo e receio de que algum adulto imbecil nos separasse de novo, e todo passo que nós dávamos, era sempre muito bem calculado. Mas lá estava eu outra vez, a mesma de sempre. Os mesmos medos, os mesmos sonhos, o mesmo sentimento. E lá estava você: diferente.
Depois disso, dos doze aos dezessete, foram todos uma sucessão de erros: meu primeiro beijo trancada num quarto com você, com medo, pega de surpresa e mais assustada ainda com o fato de ter sido empurrada naquela cama ao lado da parede e só ter conseguido me livrar de você quando te empurrei e saí correndo destrancando todas as portas possíveis, mas trancando a do banheiro, aonde fiquei por longos minutos encarando meu reflexo no espelho sem saber direito o que pensar e o que sentir. Mas meu inconsciente processava direitinho a informação: metade do sonho já tinha sido destruído. O nome disso era expectativa; o nome disso era ilusão. Era isso então o que acontecia com as pessoas que sonhavam demais, liam livros e contos-de-fada demais. Não tinha sido como nos livros, não tinha sido como eu queria. Nunca foi.
Eu então, resolvi me afastar de você, nunca foi do meu feitio ser forçada à fazer as coisas, e eu não deixaria meu inconsciente processar a mesma informação que antes, de novo. Mas, mesmo afastada, mesmo te odiando por motivos pequenos e imbecis, eu ainda revivia a história que eu mesma inventei, de que um dia você ia perceber o quão idiota tinha sido naqueles anos, e ia ser o cara que eu fantasiava. Eu não tinha noção, nessa época, que são raríssimas as fantasias que se tornam realidade e que muitas pessoas não mudam. Você sempre foi uma delas.
Passei noites sonhando com um você que não existia na minha realidade, um você que eu desejava ser bom, carinhoso e que fazia por merecer cada sorriso meu. Mas tudo o que você fez por merecer, foram minhas lágrimas. Inclusive quando você casou e logo em seguida, sua namorada engravidou. Chorei, quis me dar um milhão e meio de murros na cara, me questionei do porque eu ter que passar por tudo aquilo, até que eu cansei. Sabia que eu era boa demais pra sofrer por alguém tão ruim quanto você. Decidi te esquecer pra sempre, e eu nunca poderia pensar que te esquecer poderia ser tão fácil. Você não me deixou nada de bom, foram – contando minha infância – dezessete anos, e nenhuma memória boa. Nenhum diálogo bom, nenhum carinho, nada. As únicas coisas que você me deixou foram o medo, a insegurança, a maturidade, a certeza de que água e óleo não se misturam, literalmente e que talvez eu seja realmente um tipo diferente, que merece um tipo diferente pra ficar junto, e não um tipo comum, como você.
A lição mais importante que eu aprendi de tudo isso é que sim, o passado machuca. Mas eu tinha duas saídas: ou eu fugia ou eu ficava, encarava e aprendia com isso. Eu arrisquei, me machuquei, sofri, caí na realidade, encarei e aprendi. Hoje, eu estou bem. Apesar da minha baixa auto-estima, da minha insegurança e de ter a leve impressão que ficarei sozinha pra sempre, hoje, o que eu nunca achei que poderia acontecer, aconteceu da maneira mais fácil e simples que poderia existir: hoje, eu estou vacinada de você.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Ele vai voltar.



Eu sei que você vai. Vi isso nos seus olhos naquela quarta-feira passada, quando você veio na minha casa. Você vai voltar independente da sua atual namorada, que quando ela vai pra cidade em que nasceu, em algum lugar muito pequeno de Minas Gerais, você liga pra mim no minuto seguinte, afim de fazer qualquer coisa: comer, ir num bar, num shopping, ou ficar na piscina da minha casa – qualquer coisa que me envolva. Você não fala, mas eu sei.
Você vai voltar, independente de quão livre você quer se sentir, quando estiver solteiro, ou independente de qualquer mulher magra que passe na sua vida. Você vai voltar por que você ama minhas neuroses e ama, principalmente, me deixar claro, mesmo que seja no meio de um desabafo de quão horrível eu me acho, que, pra você, eu já era linda quando você era apaixonado por mim e que eu ainda continuo sendo, mesmo depois desses anos todos.
Você vai voltar por que você ainda tem aquela veia sadomasoquista e eu ainda tenho aquela veia de quem gosta de pisar, ser irônica, sarcástica e tudo mais o que você passou nesses anos todos, correndo atrás de mim.
Você vai voltar, independente do passado que, segundo você, te fez alguém mais frio hoje, no presente. Eu sei que isso não é verdade, assim como você também sabe. Você é o mesmo de cinco, quatro, três anos atrás.
Você vai voltar porque ontem, quando eu estava com minhas amigas em um lugar qualquer e jurei ter te visto passar na rua – e ter me ignorado por estar de mãos dadas com uma mulher – e te liguei, você disse que, apesar de estar ainda na faculdade àquela hora da noite e de estar cansado, iria passar na sua casa, tomar um banho e me encontrar lá. E eu não tinha nem cogitado essa idéia, até então.
Você vai voltar por que ontem, nos cinco minutos de uma quase-crise que eu entrei, em um lugar movimentado, com um monte de pessoas olhando, você me abraçou e disse que ia ficar tudo bem e que eu teria você do meu lado, caso eu precisasse.
Você vai voltar com o seu jeito simplista de ver as coisas, pra bater de frente com o meu complexo e profundo, de querer enxergar tudo nas entrelinhas. Eu enxergo você nas entrelinhas.
Você vai voltar porque adora minha ansiedade que, segundo palavras suas, estão presentes em todas as poucas partes minhas que você conhece.
Você vai voltar e eu provavelmente não saberei o que – mais uma vez – como agir, fazer e aceitar que alguém tenha sentimentos tão grandes por mim.
Você vai voltar, vai olhar pra mim e rir, eu vou te chamar de imbecil com um sorrisinho no rosto, sabendo intimamente que não, você não voltou. Por que você nunca nem foi.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Tudo o que eu queria.




Tudo o que eu queria, era ter ânimo pra acordar de bom-humor. Sempre que vejo alguém sorrindo logo nas primeiras horas da manhã, logo concluo: ou ela passou a noite toda acordada e não teve tempo pra dormir ainda, por isso, não teve que acordar e não está de cara fechada, ou, ela se sente completa.

Tudo o que eu queria, era ter forças pra levantar. Sair do único lugar que nada nem ninguém pode me magoar, e enfrentar o dia, enfrentar as pessoas, enfrentar a guerra que é da porta do meu quarto pra fora. E eu faço isso mas não por me sentir completa. Mas por necessidade. E tudo o que eu queria, era fazer isso com prazer.

Tudo o que eu queria, era ter cara-de-pau o suficiente pra fingir aceitar quando ela me disse que sabia que tinha errado, que sabia que era falta de consideração, que sabia que tinha tomado uma decisão sem medir as conseqüências. Eu queria mesmo, era poder ter conseguido prestar atenção em tudo o que ela me dizia mas, tudo o que se passava pela minha cabeça era: alguém precisa de salvar. Não posso mais me dar ânimo sozinha, nem força, nem paciência. Alguém precisa me tirar daqui. E eu esperei. Durante a meia hora que durou aquela conversa, eu esperei, mas ninguém apareceu.

Tudo o que eu queria era ver cor em tudo. Tudo o que eu queria, era ser amada.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Bem-vinda de novo.




Como num filme. Não queria usar o exemplo de um filme de romance, primeiro pra não ficar muito clichê, segundo por que o “romance” não cabe aqui. Igual em um filme no qual você sabe o final: sabe que o vilão vai morrer, sabe que o bem reinará ou que o casal vai então, finalmente, ficar juntos. Eu sabia o final, entrei sabendo o final. Dizem que é quando vai chegando o fim, que nós pensamos nele, o começo. Então, o que eu posso fazer, quando nem um começo existiu? No que eu penso, então? Em como sou idiota, em como gasto minhas palavras diante de alguém que eu poderia apostar tudo o que tenho, que nem lembra que eu existo? Aham. É isso que me resta pra pensar. É só o que eu tenho pra pensar. Nesse muro de dezenove anos, uma profissão, algumas vidas que melhoraram pelos seus atos, sua falta de coragem pra terminar algo que, até aonde eu entendi, você leva somente por comodismo e sua possível descrença no sentimento que eu procuro em cada esquina que eu viro: o amor.
É triste saber que eu cai nessa realidade e que, cada quinta-feira que passar, vou ouvir sua voz ou olhar seu rosto e o resto do mundo não vai desaparecer e que, no máximo, o mundo vai ter algumas dessas cores em tons pastéis. Nada mais colorido e reluzente, como antes. Eu disse que não ia demorar. Eu pedi pra que não demorasse. E eu deveria saber, eu deveria ter lembrado em ter cuidado com as coisas que se deseja, por que algumas você pode conseguir. E, por ironia da minha vida ou não, eu tenho uma facilidade imensa de conseguir todas as coisas ruins. Tentei voltar atrás, juro que tentei reunir todas as minhas forças, todos os tipos de energia positiva, todo o tipo de pensamento fixo para que alguma coisa iluminasse o seu caminho e conseqüentemente o meu, mas acho que já era tarde demais. Não queria, mas, o máximo que eu posso fazer, é te transformar em uma figura de admiração. Você merece mais que isso, eu sei. Mas é o máximo que você pode me dar.
Agora, o que eu vou fazer, é esperar. Esperar a minha próxima síndrome do pânico, o próximo temporal, a próxima vez que acabar a luz, só pra ver pra onde meu pensamento vai voar. Sinto até uma certa ansiedade, quero saber o que fazer, quando me ver em apuros e saber que dirigir meu pensamento pra você, que estará fora do país essa semana, com a sua namorada, é a coisa mais patética que um ser humano poderia fazer. Portanto, vou vivendo, vou querendo parar com essa vidinha de sonhos, fantasias e admirações e tentando, rezando, desejando ter um amor pra vida.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

Onde termina o rio.



Sentada ali, ela pensava: não tenho boas lembranças da infância. Parece que eu já sabia de muita coisa ruim que não deveria saber. A única coisa que eu me lembro que era realmente bela, era essa margem do rio. A mulher que morava conosco estava sempre brava. Sempre fumando. Não sei por quê. Ela ascendia um cigarro atrás do outro. Tocava-os como faíscas, coisa que combinava com seus olhos. Ela nunca me batia, pelo menos, não tão forte quanto o companheiro dela, mas, apesar disso, sua boca feria meus ouvidos. Certa vez ouvi dizer que ela era como o diabo engarrafado, mas eu sinceramente não acho que se beba a maldade. Você pode tentar afogá-la, mas, pela minha experiência até então, ela nada muito bem. Pra escapar disso tudo, sempre venho aqui, na margem do rio, pensando que isso ajudaria na minha asma. Mas eu sabia que não. Talvez morrer fosse a única coisa que ajudasse a minha asma.
Com um tijolo sobre o meu peito, cada inspiração era quase como um milagre, naquela época. Isso tornava um pouco difícil externar o que eu pensava ou sentia. Uma voz lá no fundo, queria que eu falasse dos meus sentimentos, tentando me puxar pra fora de mim mesma. E eu dizia a ela:
- Esqueça os sentimentos, eu posso sentir mais tarde. Me dê um pouco de ar.
Entre a mulher da garrafa, os remédios e a falta de ar da qual eu não conseguia me livrar, havia uma desconexão entre minha boca e meu coração. Alguma coisa dentro de mim estava rompida. Eu viva em pedaços. Talvez ilhas seja uma palavra melhor. Sempre que eu me arrastava pra dentro de mim e olhava em volta, não via um todo. Ou uma parte principal. Via um continente cortado e partido, cada seção flutuando sem rumo em algum canto distante do globo. Uma noite, eu resolvi ouvir a voz que falava dentro de mim, sempre muito baixo para minha respiração muito forçada e alta, e resolvi escrever; escrever sobre o mundo no qual desejava viver. Nunca contei isso à mulher da garrafa. Sempre tive medo. Nunca tinha conseguido compreender por que nunca pude ser boa o suficiente pra ela, pra ele, pra todos eles. Até que um dia, como se fosse um raio de luz, a resposta me veio à cabeça. Simples, muito simples. Eles não me ensinaram nada do que eu faço, do que eu sou. Nada. Desde sentimentos, até valores morais. Não poderiam ter me ensinado nada disso, por que não conhecem, por que não sabem nada disso tudo. Não poderiam amar, serem justos, terem valores nem para salvar suas próprias vidas. O que eu tenho vem de um lugar que nem eles, nem eu conheço. Fui tirada desse pensamento pela voz. Ela me dizia:
- A vida não é fácil. Na maior parte do tempo, é difícil. Raramente faz algum sentido e nunca vem com um belo laço em volta. Parece que, quanto mais você envelhece, mais ela tenta derrubá-lo, derrotá-lo, deixá-lo sangrando...As pessoas vêm até esse rio por vários motivos. Alguns estão se escondendo, outros fugindo,tentando esquecer...Qualquer coisa pra aliviar a dor que nós sentimos e todos nós chegamos aqui sedentos. Portanto, se um dia você se machucar e não sentir nada além de dor; se um dia você mergulhar no poço e ele estiver vazio, com nada além de pó, então deve voltar pra cá...mergulhar e beber profundamente.
E eu o fiz.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

A moça que ninguém vê.



Nem se ela quisesse, passaria despercebido. Então, todos que estão por perto, a observam. Falam do seu corpo nem tão perfeito assim, comentam sobre suas roupas, seu mistério, seu sorriso. Mas, se a moça olha, logo mudam de assunto, finge que estão em qualquer universo bem longe dali. Se a moça resolve pedir ajuda, ninguém escuta realmente e, se quiser companhia – nossa, coitada da moça! – vai continuar sozinha por aí. É assunto na sala de aula, atrai alguns olhares na rua e quando sai – uma vez na vida e outra na morte – a noite, também. Mas ela dorme sozinha e tem um vazio no peito que ninguém tem uma mínima vontade sequer, de ocupar. A moça tem um coração pesado, transbordando emoções, que ninguém quer carregar. Quem olha de longe, não percebe, e, quem não se aproxima, nunca vai saber que essa moça devora livros com a mesma intensidade que um morto de fome devoraria um prato de comida; que queria saber dançar sem se sentir ridícula por isso; que trocaria uma balada pra assistir uma orquestra; não se contém quando vê uma criança ou um bebê e vê pequenos detalhes onde os outros enxergam o cotidiano. E que, acima e mais importante de tudo: está cansada de tanto assustar e afastar as pessoas, cansada de esperar vidas se resolverem pra que a sua comece, então, a andar. Agora, eu te pergunto: quem vai cuidar essa moça triste? Quem vai levar de prêmio o amor dela? Quem tem coragem de assumir o desafio e o tal do coração pesado? As chances são mínimas, as pessoas são mais mínimas ainda. E a moça sabe disso. Porém, ela simplesmente respira fundo, e espera. E esperar, dói.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Herói.



Tenho voltado a ter fé, eu acho. Pensando em você, pensando que, talvez, se eu rezar, se eu fixar bem meus pensamentos e se eu pedir muito, serei atendida. Talvez com minhas orações, nossos caminhos se cruzem num dia desses e, caso isso aconteça, tenho certeza que será bem no dia que estarei com minha pior roupa, meu pior cabelo, e meu pior humor. Outro dia li, que a ansiedade impede que os acontecimentos fluam com naturalidade. Mas olha, você não sabe como é quase impossível, pra mim, controlar o nervosismo com as minhas mãos, controlar minhas pernas, controlar meu coração que, ao sentir que a porta vai ser aberta e você vai sair de lá, pula até meu cérebro e volta, repetitivamente. E depois esperar uns certos minutos, pra que ele se acalme de novo.
Você não sabe o quão difícil tem sido, tirar você do centro dos meus pensamentos. É complicado quando não se tem mais nenhum estímulo, quando sua vida anda tão monótona e quando você se entrega em dó nem piedade, pra alguém que você nem conhece. E é mais difícil ainda, saber que esse alguém é você. Você não sabe como foi impossível não pensar em você essa madrugada, quando a luz acabou, e eu contei do cinco ao um, de trás pra frente, a chegada da minha síndrome do pânico. Sabia que o pavor que eu tenho de escuro, faria ela aparecer, mas eu também sabia que, se eu pensasse com todas as minhas forças em você, ali me abraçando, passaria. E passou.
Não pense que meu pensamento voar pra sua imagem, me faz mal. Até faz, mas não na maioria das vezes. Porém, isso não pode continuar por que, caso um dia tudo isso vire realidade, eu, do fundo do coração, não quero mais ser uma dessas pessoas que sonham tanto que, quando algo acontece, não há como ele corresponder aos devaneios que o anteciparam. E isso sempre acontece. Portanto, estou tentando me policiar sempre em relação à sua imagem, mas tem sido difícil, afinal, não é todo dia que alguém consegue me salvar. E isso, você não sabe, mas eu te conto: você faz muito bem.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

38 anos.



Demorou, mas hoje consegui cair um pouco em mim. A razão tomou conta do meu cérebro e coração, me arrastando de volta pra minha triste realidade. Não, não diria triste; dura, talvez. Irônica, patética, estúpida. Você pode escolher qualquer um desses adjetivos, todos se encaixam perfeitamente. Sempre odiei números, fugi de todos a vida inteira por que sempre me trouxeram irritação, stress, inquietude e ansiedade. Achei que não seria mais abordada por tais sentimentos, mas, veja lá quem foi que me fez cair na real, hoje. Eles mesmos, os números. Não adianta, eu fiz e refiz a conta no papel, depois tentei mais mil vezes na calculadora, e você bem sabe: os números não mentem. Nunca mentiram pra ninguém, e não seria logo pra mim que mentiriam. Desde que entrei nessa, de te admirar, sempre achei que quando caísse na realidade, seria por alguma atitude sua, algum "oi" mais duro, algum passo que envolvesse um outro alguém - que não eu -, algum defeitinho qualquer. Mas não. Cair na realidade foi como se jogassem um balde com um iceberg na minha cabeça, ou como se dez homens lutadores de jiu-jistu me dessem socos repetidamente no estômago. Eu de verdade não estava esperando. Não hoje, que minha semana estava tranquila e eu estava contando os dias pra te ver, juntando o máximo de energias que eu tenho dentro de mim para que, quando você me visse, percebesse qualquer resquício de afetividade vindo do meu olhar, meu corpo, meu sorriso. Não hoje que eu passei a noite toda passada lutando com sensações horríveis e minha síndrome do pânico. Não hoje, que lembrei ter tido algum sonho com você, na madrugada de segunda pra terça. Não era hoje que eu gostaria de ter esses pensamentos racionais. Pensamentos que são necessários, porém, não eram necessários agora. Eu estava melhor sem eles, pode apostar. Dezenove anos atrás, pelas minhas outras contas, você já devia estar com mil e um planos no seu segundo ano de faculdade de direito. Dezenove anos atrás, você já tinha habilitação há um e deveria dirigir como um louco, assim como homens dessa idade fazem. Dezenove anos atrás, você deveria estar traçando os planos que estão se concretizando hoje. Dezenove anos atrás, você já tinha quebrado um coração aqui, outro ali, já devia ter o seu com alguns arranhões e também já tinha algumas passagens por camas femininas. Dezenove anos atrás, enquanto tudo isso e sabe-se mais o que te acontecia, eu simplesmente dormia quietinha no meu canto, com a minha chupeta e meus sete meses de vida.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

O que você nunca vai saber.



Vou colocar todo o meu melhor numa caixa e te entregar, te dou a minha palavra, eu prometo. Não pretendo te contar sobre as minhas lutas mentais. Você terá nas mãos a minha simplicidade e leveza que, podem não ser tão verdadeiras assim, mas que foram criadas pra não assustar pessoas assim, como você. Prometo te deixar com a minha melhor parte, sem as complexidades dos meus pensamentos, minhas inseguranças, minha síndrome do pânico, meu medo de escuro, meu mau-humor quando acordo e minhas lágrimas até em comerciais de tv. Prometo esconder de você meu sorriso ao ver uma criança ou um idoso, mesmo que seja há metros de mim, ou quando passo em frente à uma loja de brinquedos e de roupas para bebês. Também vou fazer meu máximo pra não te incomodar com meu senso de justiça, com meus questionamentos sobre as voltas que a vida dá e minha revolta com as pessoas que me cercam. Vou te deixar de fora da desestrutura que é a minha família e da desestrutura que eu me torno, às vezes, por conta deles. Paro de sorrir pra todos enquanto caminho na rua ou num shopping, se você achar que isso também tem que fazer parte dessa promessa. Vou baixar o volume da minha voz, da minha risada e do meu sarcasmo, também. Mas, talvez, se eu algum dia, te disser uma palavra ou outra da minha tristeza e solidão, será só pra ganhar um pouquinho mais de carinho. Prometo o meu melhor, que está aqui guardado em mim, e que tem me sufocado, e, cá entre nós, você precisa ficar sabendo que essa não é lá uma oferta muito comum, vindo de mim. Sei que pedir tanto pra te ter pra mim, pode ser algo egoísta, e eu também sei que, nada vai se concretizar e eu vou ficar sem chão esperando pra fazer as mesmas promessas pra outro alguém. É sempre um risco, eu sei. Mas olha, eu prometo que você não vai ficar sabendo da minha mania de me expor em palavras, e que eu estou escrevendo sobre você nesse exato momento. Mas, por favor, não pense que é falta de consideração da minha parte, por que, seja inteligente - e eu sei que você é - : há duas maneiras de saber o que eu digo e não digo: lendo o que eu escrevo e olhando nos meus olhos. E essa segunda opção, vem junto no meu pacote de promessas.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

As horas.



Há alguns dias atrás, duas semanas, pra ser mais exata, dei o meu mais sincero sorriso que berrava entre os lábios: consegui. Passei a encarar as coisas racionalmente, deixei tudo que gritava aqui dentro, de lado. Você pensou mesmo que essa sua barba teria efeito comigo todas às quintas-feiras que nos víssemos, né? Ou que todas suas camisas xadrez fariam eu sorrir e pensar que, pra um homem, você até que entende do que está na moda? Ou que, ainda, eu iria da terra para o céu em dois segundos, quando você surgisse na porta, de paletó e gravata? Não, não mesmo. Ou, pelo menos, era o que eu achava. Isso, eu achava. Sabia que minha cabeça não teria condições de controlar meu coração por muito tempo. Durou bastante até, dessa vez. Duas semanas, pra quem a vida inteira foi sempre, coração, coração e coração, é bastante coisa, não?
Tentei aproveitar ao máximo essas duas semanas nas quais meu cérebro dizia, sem muita delicadeza, todos os contras que existem perante você. "Veja bem, ele é mais velho. Não dois, nem cinco anos. Mas, pelas suas contas, ele com total certeza já tinha quebrado alguns corações, enquanto, na mesma época era apresentado à você, um mundo de contos de fadas, príncipes e um grande amor. Mundo que, cá entre nós, você vive até hoje.", ou então: "Vai no espelho. Isso. Agora, pensa nele. Isso. Preciso te dizer mais alguma coisa?". Mas tudo isso, não durou muito. Meu cérebro berrou o quanto pode, tentou me alertar, me trazer de volta pra realidade. Não adiantou. O efeito "cérebro" passou tão rápido quanto veio. Hoje - e sempre - regida pelo coração, voltei ao meu normal. Voltei a lembrar de você sempre, por que qualquer página que eu viro, qualquer placa que eu leio, qualquer canal que eu assista, tem algo com seu nome, sua profissão ou algo que se assemelhe você. Continuo sem descobrir aonde você peca em ser tão deus e, ao mesmo tempo, me passando a nítida impressão de que gostaria de se tornar um reles plebeu. Algum erro há de ter. Continuo contando as horas pra ver você, mesmo sabendo que é algo que não dura nem um minuto, porém, eu levo no mínimo vinte pra me recompor. E, caso você esteja em dúvida, sua barba, suas camisas xadrez e seu paletó e gravata continuam com o mesmo efeito sobre mim.

domingo, 24 de outubro de 2010

Seu aniversário.



Veja bem: antes de mais nada, quero deixar registrado, logo nas primeiras linhas, que eu tenho total noção de quão ridículo tudo isso é. E que eu também tenho vergonha e escrevo isso vigiando a porta, com medo de que alguém entre e me veja escrevendo algo tão patético. Descobri na quinta, que ontem seria seu aniversário. E eu, boba do jeito que sou, fixei meu pensamento em você, quando ainda faltavam dez para a meia noite, de sexta pra sábado. Se tivesse seu telefone, te ligaria assim que o ponteiro marcasse que, pronto, já era seu aniversário. Ser a primeira a te dar parabéns. Porém, tudo o que eu fiz, foi ficar indagando quem terá sido a primeira pessoa a pular em você, te abraçar bem forte, e desejar que você fosse a pessoa mais feliz do mundo, não só no seu aniversário, mas pelo resto dos dias. Talvez tenha sido eu, a primeira a te dar parabéns. Por pensamento, claro, mas acho que fui eu. Peguei no sono rápido, e acordei na ainda manhã do seu aniversário. De novo, comecei a pensar se sua namorada - por que sim, você tem uma - te presenteou com um café-da-manhã na cama, com uma gravata nova ou, até quem sabe, alguma fantasia sexual. Talvez, eu tenha, de novo, sido a primeira pessoa a te presentear, também. Não com um café-da-manhã na cama, uma gravata nova ou uma fantasia sexual. Mas eu te presentearia tentando, por em palavras, o quanto você me encanta, mesmo eu sabendo apenas coisas básicas sobre a sua pessoa. Depois, no almoço, pensei que, bem, você deveria estar com sua mãe, sua irmã e suas sobrinhas, sempre tem essas comemorações familiares em aniversários. E que, talvez, você estivesse desejando, sem dizer pra ninguém, que seu pai também estivesse lá com vocês, mesmo você sabendo que ele já se foi há algum tempo. E a noite, quando olhei no relógio e vi que eram quase dez da noite, quase pude ouvir o chuveiro sendo desligado por você, sentir o cheiro do sabonete e do shampoo se misturando, e te ver na porta do armário, pegando sua roupa para encontrar seus amigos. Hora de comemorar com eles. Mas, como eu disse, eu quase pude ouvir, sentir e ver. Isso não aconteceu, por que, enquanto você provavelmente parava em frente ao seu armário, sentindo o cheiro do sabonete na sua pele, o único armário que eu via, era o meu, o único cheiro que eu sentia, era do meu perfume. Mas, mesmo assim, nos meus pensamentos, sorri, disse pra você ter juízo, te dei um beijo na testa, e deixei você ir, pra encontrar seus amigos, e sua namorada. E, mesmo sem nunca ter te tocado, desejei que você fosse feliz ontem, e sempre.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Acaba logo.



Há exatamente uma semana atrás, eu rezei. Rezei em voz alta, com a maior fé que poderia existir dentro de mim. Se alguém viu, ou escutou a cena, provavelmente pensou que eu enlouqueci de vez e que, agora, não tem mais volta. Coloquei toda intensidade possível nas minhas palavras. Não sei se algum deus, algum anjo ou alguém mesmo que te conhece ouviu, mas assim eu espero. Eu preciso que alguém chegue em mim, e me conte algo muito horrível sobre você, algum defeito que eu julgue ser muito sério, alguma coisa que tire toda essa cor de você, ou todo esse poder de me levar até o ponto mais alto em questão de segundos, e depois me deixar cair, sozinha.
Pedi pra qualquer uma dessas divindades me dar pelo menos uma pista do que eu posso fazer, pra acabar com meu próprio sentimento. Você não sabe, mas eu não consigo aceitar coisas bonitas por muito tempo, crescendo dentro de mim. Não consigo não me sentir como uma menina de 13 anos, quando sei que, se acontecer algo de errado segunda-feira, se algo não der certo da terça e se quarta eu brigar com alguém, tudo bem. Quinta-feira vou ter meu "Oi, tudo bem?", vindo de você, não vou?! E, se sexta algo me frustrar, não vai ter tanta importância assim por que, oras, quinta feira passou. Seu olhar passou. Seu sorriso sem mostrar os dentes passou. Você passou. E isso faz tudo um pouco melhor, (in)felizmente.
Já tentei me convencer que, não, não dá, imagina. Você freqüenta a academia, deve comer coisas saudáveis e, bom, olha pra mim. Pagaria para que alguém exterminasse todas as academias e comidas saudáveis do mundo. Ou que você é demais pra mim. Tem um cargo importante, é alguém importante, é alguém em uma etapa acima da que eu me encontro hoje, na vida. Mas nada disso consegue ser suficiente o bastante.
Não dá mais pra aguentar. Não vejo a hora que tudo isso acabe, que eu pegue aversão à você, que eu não possa nem ouvir alguma palavra que comece com a mesma inicial que a do seu nome, que sentirei vontade de vomitar, que sentirei vergonha de mim mesma por gastar minhas palavras com você, meus sentimentos com você, dos comentários que eu faço sobre você. De eu pensar:"nossa, como você é estúpida, menina!". Olhar pra trás, e não acreditar em quão "menininha" eu possa ter sido, em relação à tudo isso. Olhar pra trás e ver que, realmente, minha vida é algo sem emoção nenhuma, a ponto de eu sentir coisas por um completo estranho. Por eu doar tanto, pra quem não me doa nada, pra quem mal sabe meu nome.
E eu repito pra mim mesma: tá demorando demais. E eu fico aqui, sentada, esperando. Eu sei que vai acontecer. Mais cedo, ou mais tarde. Sei que vai chegar o dia que terei o que eu tanto peço: a destruição de um sonho, de uma fantasia, de um estímulo, de uma inspiração, de um desejo, de uma vontade, de você.

domingo, 17 de outubro de 2010

Eco.



Paro, e tento escutar alguma coisa. São quatro da manhã, e não há um barulho se quer, na rua, na vizinhança. Não há nem o barulho do vento, ou de algum cachorro meio distante, latindo. Isso não é de se espantar, afinal, são quatro da manhã e, a essa hora, todo mundo está dormindo. Menos eu. Gosto de madrugadas, desse silêncio que elas proporcionam por que, só assim, consigo escutar todo o barulho dentro de mim. Mas não foi o que aconteceu hoje. Nada. Vazio. Oco. Nem um ruído, nem um pensamento, nem uma fantasia, nem uma vontade. Literalmente, nada. Bate aqui no meu peito. Sentiu? Oco. Pode me beliscar o quanto quiser. Vai ser zero pra dor e um a menos pra vibração. Tento gritar, mas o grito volta. Eco. Não há quem ouça do outro lado desse abismo imenso. Antes, eu lembro que tinha fé, rezava para tudo o que eu acreditava e conversava com quem estivesse ali, pra me proteger, e me dar forças. Hoje, não passo daquele pai-nosso e ave-maria com os olhos fechados, morta de cansaço. Eu precisava de uma fé incalculável para me arrastar pra fora da cama e encarar tudo o que me esperava por trás da porta do meu quarto. Hoje, eu ainda preciso dessa fé incalculável, mas ela entrou em modo automático. Levanto da cama por que é preciso, estudo por que só assim serei alguém na vida, encaro o que tenho que encarar, por que não dá pra fugir. Por que não posso falar não. Por que não tenho pra onde correr. Pra quem correr. Não é fácil ter que cuidar de você ao mesmo tempo que outras pessoas precisam de um cuidado especial vindo também de você. Perdi a minha fé. Não entendo por que tenho que encarar tudo sozinha, por que eu preciso cuidar de todo mundo, por que eu tenho que me deixar morrer todo santo dia, por uma causa que é simplesmente, perdida. Quando você passa muito tempo sendo ignorada pela vida, começa a vê-la com outros olhos. Olhos cansados, sem brilho. Olhos que não tem vontade nenhuma de olhar pra frente, procurar na multidão, algum reconhecimento. Tem sido difícil, rude. E, no final do dia, quando eu posso voltar pro meu quarto, quieta, sem ninguém, nem vozes, barulhos, somente ecos, tenho duas certezas: explodir - por que a pele ficou pequena demais - em cinzas ou sonhos; ou implodir, desabar dentro de mim, cansada e sem forças pra continuar.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Tudo bem.



- Oi!
- Oi, tudo bem?
- Tudo bom?

(Olha, tudo bem, tudo bem mesmo, não está, não. Mas acho que nunca tá tudo bem pra qualquer pessoa no mundo, mas vou aproveitar que a pergunta veio direcionada à mim, e responder. Não está tudo bem. Tenho tantas certezas dentro de mim, sabe? Sobre mim, sobre os outros, sobre a vida. Mas às vezes, penso que é só mais uma dessas minhas idiotices minhas, talvez possa ser só mais uma parte desse mundo de mágica que eu construo aqui dentro, por que você sabe, né? Quando a nossa vida real é quase toda fragmentada de pequenas tragédias, pequenas loucuras, pequenas neuroses, que saída nós temos? Inventar um mundo aonde nada disso exista, ou possa até existir, mas não te afeta, não te provoca, não te faz querer sair correndo, sempre. Correr até cansar, até suas pernas doerem, até as mesmas dormirem. E pronto, você está longe de toda essa doença. Você tá me entendendo? De repente, essas minhas certezas desaparecem, e eu passo a ser quase igual a uma criança: que se esconde de tudo, e tem medo de escuro. É mais difícil passar por isso quando não se tem alguém pra segurar sua mão, você não acha?
Só que, de repente, me dá um estalo, e lá estão todas minhas esperanças, sonhos, desejos e certezas, de novo. E não sou mais aquela criança assustada, porém, continuo com o medo do escuro. E mesmo sem ter ninguém pra segurar minha mão, eu vou, eu continuo. Eu tenho que continuar, certo? Talvez seja essa a única saída, o único jeito de eu sair viva daqui. Às vezes acho que eu não tenho muito tempo, e vão me matar antes que eu viva minha formação acadêmica, meu primeiro paciente, meu primeiro namorado, meu casamento, meus filhos. Me matar antes que minhas certezas possam se concretizar e possa, também cuspir na minha cara, o que elas sempre gritam dentro de mim: sim, menina, sim. A felicidade é algo para você. Você esperou, e agora, aqui está).

Respiro fundo tentando não deixar transparecer minha vontade de morrer pelo seu terno e gravata, e respondo, com a voz mais meiga que talvez exista dentro de mim e um sorriso:

- Tudo bem.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Branco e Preto.



Andei pensando (pra variar) durante dias, e tive a leve sensação de que vivo numa vida em branco e preto aonde eu, no máximo, faço uma aparição aqui, outra ali, mas que, na maioria das vezes, não basta de figuração. Aquela história de figuração na vida real, sabe? Isso mesmo. E nessa vida que eu vou levando - não sei há quanto tempo, mas mesmo assim, vou levando - algumas pessoas se destacam. Algumas pessoas têm cor, e participações especiais. Não na minha vida em preto e branco, mas no cenário, em si. É aquela coisa, né? A vida está aí, não para nunca, e algumas pessoas nasceram pra se destacar, pra fazer a diferença, pra se fazer notar, pra se fazer ter cor. Outras, simplesmente estão de figurantes, pra não deixar a tela muito vazia. Você pode se sentir vazia. A tela, não, nunca. E como eu ia dizendo, algumas pessoas tem cores. Como aquele moço sendo extremamente educado com um funcionário, o que fez com que, aos meus olhos, ele ganhasse cor na hora. Ou então, aquela velhinha fofa atravessando a rua, e sorrindo até pra árvore. E até mesmo você. Ainda não consegui entender exatamente de onde sai sua cor, por que você tem cor, por que você não é figurante. Tá, pode até ser pra outras pessoas, mas pra mim, você é quase como um protagonista desses que a gente gasta dinheiro no cinema, só pra ter o gostinho de ver. Esqueço a sua voz 10 minutos após ouvi-la, e quase esqueço que você existe, depois de alguns dias. Mas sabe aquela história da raposa? "No início, você se sentará um pouco longe de mim, assim, na grama. Eu olharei pra você com o canto dos olhos, e você não dirá nada. As palavras são uma fonte de mal-entendidos. Mas a cada dia você poderá se sentar um pouco mais perto...Se você vier, por exemplo, todas as tardes, às quatro, a partir das três eu começarei a ser feliz. Com o passar da hora, a minha felicidade vai aumentar. Quando chegarem as quatro horas, começarei a me agitar e a me inquietar; descobrirei então, o preço da felicidade. Mas, se você vem a qualquer hora, eu não saberei nunca a que horas devo preparar o meu coração...São necessários rituais."
Sim. São necessários rituais. Meu ritual em relação à você, não passa de um simples sorriso e uma pergunta que eu faço todas as manhãs pro porteiro da minha faculdade: "Oi, tudo bem?". Mas conto os dias da semana, e, quando o dia realmente chega, arquiteto planos e histórias na minha cabeça de fantasias, querendo, bem no fundo, que você tenha também, um ritual quando se trata de mim. Que você não necessariamente conte os dias da semana, ou as horas, afinal, imagino que isso seja coisa de mulher, mas que você saiba que, ao sair dali, a pessoa sentada vai ser eu, que vai te olhar, sorrir e fazer aquela pergunta cretina, que você sinta aquela adrenalina no pico mais alto, e logo depois, ela descendo, descendo, e você se sentindo no branco e preto, mais uma vez. Mas você não deve se sentir no branco e preto, né? Mesmo que você se sinta, ou mesmo que você seja, pra mim, você tem as cores mais radiantes do mundo. E eu não sei por quê.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

A demora.



Não sei, ela me parece ansiosa. Essa menina, eu digo. Quase me passa tranqüilidade, quando encosta sua cabeça na janela, e as gotas da chuva ficam fazendo um fundo bonito, eu diria. Logo, ela pega o celular, mexe em alguma coisa, desliga, volta a encarar a chuva lá fora. As pernas balançam de um lado pro outro, e talvez eu possa afirmar que vi ela dizendo pra si mesma "tá demorando demais". Me pergunto: o que será que está demorando demais? A chuva passar? Uma ligação? Um email? Não sei o que é. Só sei que parece estar demorando. Vejo ela mudar de posição e, sua cabeça, que antes estava encostada no vidro, agora está reta, encarando algum anúncio colado em uma das paredes, enquanto suas pernas, que antes estavam cruzadas, estão uma do lado da outra, com os cotovelos ali repousando. Posição feia, penso eu. Se ela soubesse que está sendo observada, talvez não se sentaria assim, mas algo está demorando.
Uma moça chega perto dela, e vejo um sorriso sendo esboçado naquele rosto que tanto espera por algo que demora. Logo, volto a pensar: era a amiga que demorava, então? Mas minha dúvida logo é respondida, quando vejo outra moça chegar e iniciar um papo com elas, porém, a que tanto espera, parece observar tudo de fora. Por um segundo, tenho a leve impressão que ela odeia tudo aquilo. Os sorrisos falsos, o papo sobre faculdade, estágio, trabalhos, roupas, marcas, novelas. Isso não tem nada a ver com ela. Mas, pelo menos, ela teve com o que se distrair. Vejo o olhar dela desviar pra algum ponto qualquer e, de novo, penso ter ouvido um "será que demora?" falando em voz baixa, novamente, só pra ela mesma ouvir. A porta se abre, e de lá sai um cara. Percebo a mudança na postura e o brilho que surge nos olhos dela. Então era ele quem tanto demorava? Não era "algo", e sim, "alguém"?
O moço a cumprimenta e sorri, mas logo vai embora. Tenho o dez-prazer de ver aquele sorriso tão bonito - e que eu vi tão pouco - ir sumindo assim, de pouquinho em pouquinho, até não sobrar nada. Então, não, não era ele quem ela esperava. Agora eu entendo como é, e o que tanto demora. Eu já deveria saber. Ela já sabe. Eles nunca são a resposta. E nunca serão. Nem eles, nem elas. Ninguém é a resposta. Nem as amigas, nem o celular, nem o sorriso, nem a chuva. Agora eu sei como ela se sente. Todas as noites, ela deita a cabeça no mesmo travesseiro, se cobre com o mesmo edredon, e repassa seu dia mentalmente. Nenhum rosto. Ninguém que ela queria ver desesperadamente no dia seguinte. Nada. Vazio. Oco. Ela já não espera mais nada.
Vejo ela se levantar, colocar a bolsa em cima de um dos ombros, e ir embora. É a única coisa que ela sempre espera. Ir embora. De todos os lugares, de todas as chuvas, de todos os sorrisos que a cumprimentam, de toda a futilidade. Ela não esperava nada a não ser, sair de onde ela está.

sábado, 2 de outubro de 2010

Boa moça.



"Vizinhos de porta, ele do 41 e ela do 42.
Primeiro lance: Ela. Bate na porta dele, e pediu açúcar emprestado para fazer um pudim.
Segundo lance: Ela de novo. Bateu na porta dele e perguntou se ele não queria provar o pudim. Afinal, era o co-autor.
Terceiro Lance: Ele. Hesitou, depois perguntou se ela não queria entrar. Ela entrou, equilibrando o prato do pudim longe do peito, para não derramar a calda.

- Não repara a bagunça...
- O meu é pior.
- Você mora sozinha?

Sabia que ela morava sozinha. Perguntara ao porteiro logo depois que a mesma se mudou. "A do 42? Mora sozinha. Morava com a mãe, mas a mãe morreu. Boa moça. Um pouco..." E o porteiro fizera um gesto com a mão, indefinido, sem dizer o que a moça era. Fosse o que fosse, era só um pouco.
A conversa começou com apresentações e trocas de informações; "Danilo","Lisa", "Capricórnio", "Leão", "Daqui mesmo", "Eu também". E continuou enquanto comiam todo o pudim, que estava ótimo. Mas quando ela disse:"Como a gente se deu bem, né?", cobrindo a mão dele com a dela, ele decidiu dar um lance preventivo e declarou que não queria envolvimentos em sua vida.

- Como, envolvimentos?
- Envolvimentos.

Antes de sair, com a cara amarrada, ela disse:

- Me empresta uma gilete?
- Gilete? Eu não uso giletes.
- Não faz mal, eu tenho uma em casa.

E saiu, pisando firme, sem olhar pra trás.
Uma hora depois, bateu na porta.

- Vim buscar o prato do pudim.

Ele viu que ela tinha cortado os pulsos. O sangue pingava latejante no corredor.

- O que é isso?!

E todo o tempo, enquanto ele estancava a sangueira da melhor maneira possível, e a colocava em seu carro, levando-a em disparada ao hospital, ela repetia:

- Ué, não era você que não queria envolvimentos? Não era você?"

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

A letra "A" do seu nome.



Não lembro ao certo, como fui parar no seu consultório.
Só sei que, desde meus oito anos, essa era a minha rotina: pular de um consultório pro outro, de uma psicóloga pra outra, de um diagnóstico pra outro.
Sempre as mesmas queixas, era sempre eu quem não obedecia, era sempre eu a errada, era sempre eu quem via coisas que não existiam, era sempre eu a excluída. E de fato, sempre - e isso é algo que me acompanha até hoje - fui a excluída. Mas hoje, eu entendo que não é um excluído totalmente ruim, tem seus momentos bons, também.
Enfim, o que eu quero dizer é que, nossa, a vida é irônica. A gente sempre imagina que sua figura de apego, aquilo/aquele que vai te fazer sentir segura, te dar estabilidade e dizer que vai ficar tudo bem, é a sua mãe, ou sua avó. No máximo, seu pai. Mas eu já deveria esperar diferente, né? As coisas na minha vida sempre foram bagunçadas e, tanto eu, quanto você, sabemos que a minha "figura de apego" não poderia ser minha mãe. Ou minha avó. Muito menos, meu pai.
E eu disse que a vida é irônica, por que, quando eu comecei nessa de, pular de um consultório para o outro, eu odiava psicólogos, psicologia, Freud e todos os seus derivados. Queria ver o capeta na minha frente, mas não uma psicóloga, ou qualquer pessoa que tivesse ligação com essa "ceita".
Porém, essa quinta feira agora, eu tive certeza de uma coisa: não existe uma pessoa no mundo que me entenda tão bem quanto você entende.
Você foi a única a não me julgar, a única que nunca me colocou pra baixo, a única que não achou que meus medos eram besteiras, a única que, quando achava - acho e acharei - que estava tudo perdido, foi lá, e me disse que não é bem assim, que ia ficar tudo bem.
A gente falou de amor, quinta passada. Eu gosto dos meus pais, gosto dos meus irmãos, já gostei de mais gente, ainda gosto de alguns. Mas machuca gostar deles todos. É quase como um fardo. Mas, a coisa mais fácil do mundo, é amar você. É fácil, é simples. Não precisa de nada, só amar e pronto, acabou. Acho que é o mais próximo do amor que eu cheguei, em 19 anos viva.
E, lá em cima, quando eu disse que a vida é irônica, foi por que hoje, eu faço o mesmo curso que você fez, há 20 anos atrás, pra tentar, 20 anos pra frente, ser metade do que você é. E por que, hoje, se eu me desespero, se eu acho que nada mais vai dar certo, que tá tudo errado, que não é aqui, não é agora, não é esse lugar, eu faço a corrida inversa àquela que eu fiz 11 anos atrás. Eu não corro de uma psicóloga, eu corro pra uma psicóloga. Eu corro pro meu porto-seguro.
Tem gente, que diz que não dá pra nomear sentimentos. Pode até ser verdade.
Mas, a minha gratidão, têm nome: Angela.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

À primeira vista.



Preciso parar com isso, de acreditar que coisas extraordinárias podem acontecer na minha vida a qualquer instante. Nunca ganharei na mega-sena, nunca serei heroína por salvar alguém que estava se afogando, não terei uma morte trágica, como um acidente de avião. Coisas extraordinárias não acontecem na minha vida. Você não vai acontecer na minha vida.
Veja bem, vamos analisar. À primeira vista, eu não passo de alguém com seus vinte e poucos anos, alguns sonhos, todas as inseguranças, talvez nenhum objetivo a ser cumprido nos próximos meses ou anos, um sorriso no rosto - sempre - e fugindo um pouco do padrão hoje imposto.
À segunda vista, porém, se você fizer uma análise, você vai constar que, realmente, eu sou alguém com seus vinte e poucos anos, com todas as inseguranças, porém, com mil e um objetivos, mil e um sonhos, mil e uma fantasias, mil e um jeitos de me interagir com qualquer tipo de criança, em qualquer lugar. Vai perceber também, que é impressionante o modo como eu achei um jeito de explicar o que aconteceu em relação à você: não gosto de ninguém mas, de repente, escapa um momento, um gesto, uma pessoa perdida, linda e única. Você. E eu fico acreditando que eu sou capaz de ser uma pessoa boa, e ser capaz de receber essas coisas boas. Mas pode ficar tranquilo, que isso não dura muito, não. Minha consciência berra dentro de mim, me puxa a todo custo de volta pra minha realidade aonde ninguém percebe, ninguém entende, ninguém vê, ninguém sente.
O que eu quero te dizer é que, eu tenho muito, muito mesmo, dentro de mim. Coisas puras, inocentes e verdadeiras, e, te juro: não quero mais dar, sem receber nada em troca. Não funciona mais, essa coisa bonita, de dar sem receber. Isso funciona em rezas, histórias de santos e demais seres evoluídos do planeta.
Não que eu esteja te cobrando algo, longe de mim, não te conheço e tudo o que você sabe sobre mim, é que, quando eu espirro, o som emitido é fraquinho. Só queria desabafar. É que é chato entregar seu sorriso de bandeja pra qualquer um, sabe?

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Branco e Preto



Andei pensando (pra variar) durante dias, e tive a leve sensação de que vivo numa vida em branco e preto aonde eu, no máximo, faço uma aparição aqui, outra ali, mas que, na maioria das vezes, não basta de figuração. Aquela história de figuração na vida real, sabe? Isso mesmo. E nessa vida que eu vou levando - não sei há quanto tempo, mas mesmo assim, vou levando - algumas pessoas se destacam. Algumas pessoas têm cor, e participações especiais. Não na minha vida em preto e branco, mas no cenário, em si. É aquela coisa, né? A vida está aí, não para nunca, e algumas pessoas nasceram pra se destacar, pra fazer a diferença, pra se fazer notar, pra se fazer ter cor. Outras, simplesmente estão de figurantes, pra não deixar a tela muito vazia. Você pode se sentir vazia. A tela, não, nunca. E como eu ia dizendo, algumas pessoas tem cores. Como aquele moço sendo extremamente educado com um funcionário, o que fez com que, aos meus olhos, ele ganhasse cor na hora. Ou então, aquela velhinha fofa atravessando a rua, e sorrindo até pra árvore. E até mesmo você. Ainda não consegui entender exatamente de onde sai sua cor, por que você tem cor, por que você não é figurante. Tá, pode até ser pra outras pessoas, mas pra mim, você é quase como um protagonista desses que a gente gasta dinheiro no cinema, só pra ter o gostinho de ver. Esqueço a sua voz 10 minutos após ouvi-la, e quase esqueço que você existe, depois de alguns dias. Mas sabe aquela história da raposa? "No início, você se sentará um pouco longe de mim, assim, na grama. Eu olharei pra você com o canto dos olhos, e você não dirá nada. As palavras são uma fonte de mal-entendidos. Mas a cada dia você poderá se sentar um pouco mais perto...Se você vier, por exemplo, todas as tardes, às quatro, a partir das três eu começarei a ser feliz. Com o passar da hora, a minha felicidade vai aumentar. Quando chegarem as quatro horas, começarei a me agitar e a me inquietar; descobrirei então, o preço da felicidade. Mas, se você vem a qualquer hora, eu não saberei nunca a que horas devo preparar o meu coração...São necessários rituais."
Sim. São necessários rituais. Meu ritual em relação à você, não passa de um simples sorriso e uma pergunta que eu faço todas as manhãs pro porteiro da minha faculdade: "Oi, tudo bem?". Mas conto os dias da semana, e, quando o dia realmente chega, arquiteto planos e histórias na minha cabeça de fantasias, querendo, bem no fundo, que você tenha também, um ritual quando se trata de mim. Que você não necessariamente conte os dias da semana, ou as horas, afinal, imagino que isso seja coisa de mulher, mas que você saiba que, ao sair dali, a pessoa sentada vai ser eu, que vai te olhar, sorrir e fazer aquela pergunta cretina, que você sinta aquela adrenalina no pico mais alto, e logo depois, ela descendo, descendo, e você se sentindo no branco e preto, mais uma vez. Mas você não deve se sentir no branco e preto, né? Mesmo que você se sinta, ou mesmo que você seja, pra mim, você tem as cores mais radiantes do mundo. E eu não sei por quê.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Para: Você.




De novo? Para, pode parar. Quando foi a última vez que eu estive aqui? Não tem nem três meses, né? E olha eu aqui de novo, pra te falar as mesmas coisas, de novo. Pode parar. Pode parar agora com esses pensamentos de que a felicidade foi, também, feita pra você. Talvez até tenha sido, mesmo, eu realmente não duvido. Mas você já não se conhece bem o suficiente pra saber que, mesmo se você estiver lá no topo, você nunca vai aproveitar cem por cento, por que vai estar alerta a cada movimento, cada respiração, cada articulação, cada piscada, esperando aquele momento? É, esse momento mesmo. O momento em que você cai.
Aliás, bem lembrado. Isso é outra coisa que precisa ser parado agora. Chega de cair, né? Já deu, não é verdade? Chega de alimentar pensamentos, fantasias, histórias maravilhosas em que alguém enfrenta o que for, ou enxerga a sua beleza - coisa que ninguém mais vê. Para. Você não está num filme de romance, aonde exiatem mil mulheres magras, bonitas e confiantes, mas é algum detalhe em você - que diga-se de passagem não é nada do que essas mulheres são - que faz com que o George Clooney te prefira. Você não está num filme aonde ele esbarra com você no mercado, e ele - não você, ele - sente um frio na barriga e pede seu telefone. Você não está num filme aonde nem idade, nem corpo, nem beleza importam.
Eu sei, eu sei. É complicado pra você sair desse mundo de fantasia, que você mesma construiu como sendo seu próprio refúgio. Não posso te culpar. Mas não dá mais. Não aguento mais vir aqui pra sempre te falar as mesmas coisas. E eu não posso deixar de vir. Alguém precisa te puxar pra realidade, menina. Não gosto do papel que me deram, e gosto menos ainda de te lembrar que o chão tá aí, duro como sempre, só te esperando mais uma vez.
Queria acabar essa carta, com a certeza de que só vou voltar, quando for pra te ver feliz com algo concreto, entregando seu sorriso e esperanças pra alguém que os dê valor, mas olha você aí de novo, já fantasiando...Ou seria eu?

Assinado: Sua consciência.

domingo, 15 de agosto de 2010

Eu quero também.



Eles não estavam trocando juras de amor, não andavam de mãos dadas, nem se chamavam por nomes infantis. Não tinha pieguice romântica ali. Mas foi a cena mais doce que eu vi: dois olhares se encontrando. Não só se encontrando: se confortando, se sabendo, se completando. Eu notei que eles eram algo além de amigos, que se desejavam e se protegiam, e foi só pela cumplicidade dos olhos, que deixavam de ser dois e se enlaçavam quatro.

Eu quis então ter um olhar pra mim. Não alguém pra chamar de meu, como diz o clichê, como grita a conveniência, mas um olhar que fosse meu por puro encaixe. Foi um pouco de inveja, talvez. Eu soube naquelas duas pessoas que elas não se sentiam sozinhas ou perdidas. Que mesmo depois de um dia cheio e chato, tinham uma certeza de carinho. E eu quis. Quis algo além da rotina do trabalho e gente fabricada com seus narizes perfeitos e cabelos penteados. Quis algo certo como o frio na barriga e a respiração travada, o coração esquecendo de bater. Quis algo errado que me fizesse bem só por escapar do caminho óbvio de toda noite. Uma espera no fim do dia, sabe? Essa espera. Não a espera de uma vida toda sem saber o que buscar pra ser feliz. Só sair do dia igual pra ter uma noite diferente. E tornar esse diferente comum só porque é bom estar perto.

Todo o amor que eu sufoquei por excesso de razão agora grita, escapa, transborda. Estou só numa multidão de amores, assim como Dylan Thomas, assim como Maysa, assim como milhões de pessoas; assim como a multidão de amores está só, em si. Demonstro minha fragilidade, meu desamparo. Eu não procuro alguém pra pentencer e ter posse, só quero uma fonte segura de amor que não dependa das obrigações, das falas decoradas, dos scripts prontos. Eu sei que eu abri mão de várias oportunidades. Sei que fiz pouco caso do amor que me entregaram de maneira pura e gratuita, só porque eu achava que podia encontrar coisa melhor. Se as pessoas estão sempre indo e vindo, eu só queria alguém minimamente eterno em sua duração, que me fizesse parar de achar normal essa história de perder as pessoas pela vida.

Vou embora querendo alguém que me diga pra ficar. Estou sempre de partida, malas feitas, portas trancadas, chave em punho. No fundo eu quero dizer "Me impede de ir. Fica parado na minha frente e fala que eu tenho lugar por aqui, que não preciso abandonar tudo cada vez que a solidão me derruba. Me ajuda a levar a vida menos a sério, porque é só vida, afinal." E acabo calada, porque não faz sentido dizer tudo isso sem ter pra quem.

Eu não quero viver como se sobrevivesse a cada dia que passo sozinha. Não quero andar como se procurasse meu complemento em cada olhar vago. Eu acho que mereço mais que isso por tudo o que eu sei que posso fazer por alguém. E fico só esperando, na surpresa do dia que eu desencanar de esperar, um par de olhos que me faça ficar sem nenhuma palavra, nada além de dois olhos se enlaçando quatro. Nessa multidão de amores, sozinho é aquele que não espera.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Tudo bem.




- Oi!
- Oi, tudo bem?
- Tudo bom?

(Olha, tudo bem, tudo bem mesmo, não está, não. Mas acho que nunca tá tudo bem pra qualquer pessoa no mundo, mas vou aproveitar que a pergunta veio direcionada à mim, e responder. Não está tudo bem. Tenho tantas certezas dentro de mim, sabe? Sobre mim, sobre os outros, sobre a vida. Mas às vezes, penso que é só mais uma dessas minhas idiotices minhas, talvez possa ser só mais uma parte desse mundo de mágica que eu construo aqui dentro, por que você sabe, né? Quando a nossa vida real é quase toda fragmentada de pequenas tragédias, pequenas loucuras, pequenas neuroses, que saída nós temos? Inventar um mundo aonde nada disso exista, ou possa até existir, mas não te afeta, não te provoca, não te faz querer sair correndo, sempre. Correr até cansar, até suas pernas doerem, até as mesmas dormirem. E pronto, você está longe de toda essa doença. Você tá me entendendo? De repente, essas minhas certezas desaparecem, e eu passo a ser quase igual a uma criança: que se esconde de tudo, e tem medo de escuro. É mais difícil passar por isso quando não se tem alguém pra segurar sua mão, você não acha?
Só que, de repente, me dá um estalo, e lá estão todas minhas esperanças, sonhos, desejos e certezas, de novo. E não sou mais aquela criança assustada, porém, continuo com o medo do escuro. E mesmo sem ter ninguém pra segurar minha mão, eu vou, eu continuo. Eu tenho que continuar, certo? Talvez seja essa a única saída, o único jeito de eu sair viva daqui. Às vezes acho que eu não tenho muito tempo, e vão me matar antes que eu viva minha formação acadêmica, meu primeiro paciente, meu primeiro namorado, meu casamento, meus filhos. Me matar antes que minhas certezas possam se concretizar e possa, também cuspir na minha cara, o que elas sempre gritam dentro de mim: sim, menina, sim. A felicidade é algo para você. Você esperou, e agora, aqui está).

Respiro fundo tentando não deixar transparecer minha vontade de morrer pelo seu terno e gravata, e respondo, com a voz mais meiga que talvez exista dentro de mim e um sorriso:

- Tudo bem.

quarta-feira, 28 de julho de 2010

O gesto



Você chegou com todos aqueles seus amigos e companheiros de time, e eu lembro de, quando vi todos vocês entrando, querer me livrar logo do abraço que estava dando em alguém que não tinha essa importância toda, e ir correndo falar com você. E foi o que eu fiz, e você, como já era de praxe, fez aquelas suas brincadeirinhas, me fazendo dar aquela minha velha risada que também te fez rir, até que nos mandaram ficar quietos, pois a palestra ia começar. Parei do seu lado, e por algum motivo, falei algum palavrão, que fez seu amigo protestar algo que eu não entendi e te fez rir, fazendo seus braços circularem minha cintura, e por ali ficarem. Até que você fez o gesto mais lindo que um homem poderia fazer, na minha opinião: beijou meu nariz.
Existe algo mais lindo que isso? Mais respeitoso, mais bonito? Não a boca, não o ombro, não a bochecha. O nariz. Sorri com toda a pouca e verdadeira meiguisse que existe dentro de mim pra você, e te beijei. Você sorriu e fez mais palhaçada, você e esse seu lado palhaço. Amo seu lado palhaço. E então, no meio disso tudo, eu paro, e penso: poderia eu, ser feliz assim? Me sentir completa, assim? Ter um gesto que eu sempre quis, assim? Ter alguém com toda a sua beleza, assim? Meu nextel vibra. Não, não poderia ser tão feliz assim, nem tão completa, nem ter esse gesto, muito menos alguém com tamanha beleza como você tem. Era tudo uma manifestação do meu inconsciente. Abro os olhos pra vida cinza, sem coisas completas, sem essa felicidade, nem essa beleza, nem esses gestos. Eu estava sonhando.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Medo




O caminho até lá foi tranquilo. Meu pai e meu irmão me levaram, e eu estava um tanto quanto calma, até consegui dormir um pouco no carro. Quando eles me deixaram lá, um medo tão, tão mais tão incontrolável tomou conta de mim, que tudo o que eu queria fazer era sair correndo, chegar na minha casa e me trancar no meu quarto e nunca mais sair dali. Mas, claro, eu sempre tive a mania estúpida de provar pra seja lá quem for que eu posso, que eu consigo, mesmo que no fundo, eu esteja gritando de tanto medo. E lá fui eu. Ou melhor, aqui estou eu. Há milhas e milhas de distancia da minha casa, dos meus pais, meus irmãos, minha terapeuta. Mas isso não tem nada a ver com o que eu quero falar aqui, agora. O que eu quero falar aqui e agora, é que isso tudo é muito estranho. Eu penso em você pra me acalmar. E o mais estranho é que você realmente me acalma. Você não acha isso estranho?
Fiquei exatamente 10 horas dentro de um avião, com uma vontade imensa de chorar, morrendo de medo, querendo minha terapeuta mais que tudo na vida e enquanto eu lutava com todos os milhões de fantasmas que existem dentro de mim, e sempre aparecem quando não devem, você surgiu na minha memória. E, meu Deus, que paz me veio. Que paz me veio em pensar em sentir sua mão segurando a minha, minha mão apertanto forte seu braço, pelo meu medo. Minha cabeça deitada no seu ombro, numa tentativa de relaxar. E, caso eu conseguisse dormir, ser acordada por você, dizendo: "Amor, amor, acorda! Já chegamos".
E o meu medo, dentre todos esses outros, é de que aconteça algo comigo, e eu não possa te dar tudo isso que tanto me sufoca aqui dentro. Será que você não entende? E se alguma coisa me acontecer antes de eu realmente te ter, pra segurar sua mão? Antes de você me ter, pra me acordar?
Por favor, aparece logo, me nota logo! Não quero mais perder todo esse tempo com meus medos e fantasmas. Não aguento mais ter só essas companhias. Preciso da sua, para afastar as deles.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

O Coiso

"A primeira vez que o coiso falou comigo, eu tinha 16. Eu tava sozinha no meu quarto, pensei “caramba, se me der um troço agora e eu ficar muito, mas muito, estranha, que será que acontece?”. Não lembro o que aconteceu, mas lembro que foi a primeira vez que o coiso falou comigo. Aí achei o coiso uma coisa maior bizarra, mas já era tarde demais. Ele se alojou no centro da minha existência, emanando seus raios e líquidos indesejáveis para meus órgãos mais vitais como meu fígado e meu cérebro. O coisa era tipo um sem terra tentando me deixar louca e enjoada. Era como se eu tivesse área saudável demais em mim e fosse injusto nenhuma doencinha poder plantar e frutificar nessa área tão improdutiva pela paz. Ele fincou sua bandeira vermelha e sua barba comunista em mim e gritou “vai sofrer um pouco sim, ou tá achando que a vida é só comprar Barbie?’ Um dia, quando eu tinha uns 16 anos ainda, o coiso soprou no meu ouvido “já parou pra pensar que você pode ficar louca?”. Puta medo que eu tive de ser louca. Aquele monte de gente normal na hora do recreio. Gente normal que ia entrar no colegial, na faculdade, transar, namorar, sofrer, arrumar empregos, ganhar dinheiro, comprar casas, casar, ter filhos, ter netos, começar a morder o nada tipo chiclete imaginário (já percebeu que "véio" gaga faz isso?) e morrer. Tudo isso enquanto eu só ficava louca. Uma vida entregue a loucura. Nossa, que medo que eu senti. Até negociei com o coiso: “pô, o resto todo até abro mão, mas deixa pelo menos eu ser feliz um pouco vai, depois posso até ficar louca”. E assim seguiram esses anos de vida. O coiso continua lá e eu continuo aqui. A gente briga, a gente faz as pazes. Ele fica enorme quando me come demais, ele fica fraquinho e quase morre quando esqueço de lhe dar comida. Ele me ajuda a escrever melhor e viver pior. Às vezes, ele se cansa um pouco ou está dorminhoco e eu aproveito o dia pra ser feliz como nunca ou como se fosse a última vez. Já tentei matar o coiso com terapias, remédios, mousses de maracujá, meditações, macumbas, espiritismos, gritos, danças, pensamentos, chás, fumaças e regimes imbecis. Mas no fundo, acho que nem quero que ele morra. O coiso ta aí desde os meus 3 anos, tadinho. Ele morreria sem se hospedar em mim e eu, certamente, sentiria um vazio ou um excesso terrível de mim mesma sem ser devorada dia-a-dia por ele. O coiso é tipo aquela avó rica chata que você até queria que morresse pra curtir a vida com o que ela tem debaixo do colchão, mas ao mesmo tempo você pensa: e como é que eu vou ser feliz sem a minha tristeza? Sem o minha avó ranzinza que guarda alegrias em baixo do travesseiro como se o mundo jamais soubesse o que fazer com elas? Ele protege o mundo da simplicidade com medo que a maluquice saia de moda. Qualquer coiso que existe desde mil, novencentos e cacete, tem medo de sair de moda. Deixa o cinza lá, deixa o coiso lá. Pelo menos eu sei onde ele está, pelo menos ele mora aqui em casa. Pior é se ele morrer e resolver me assombrar. Hoje o coiso me fez acordar às cinco da manhã. Dei um sobressalto e acordei assustada, com medo de engolir o inseto imaginário que o coiso, mais uma vez, botou na minha goela só pra zoar comigo. Nem dormir eu posso mais. Aí resolvi quebrar o pau com ele. Chamei o coiso e o coloquei sentadinho na minha frente. Falei, falei e falei. Mostrei pra ele quem manda. E sabe o que ele fez? Falou, no maior cinismo, que não tinha botado inseto imaginário nenhum na minha garganta. Eu é que tava ficando louca."

T.B

segunda-feira, 5 de julho de 2010



Tenho uma vontade imensa de cuidar de você. Sabe? É, isso mesmo, cuidar. Passar a mãos nos seus cabelos com a intenção de ajeitar os fios, arrumar o nó da sua gravata, ouvir você reclamando de como foi seu dia, de como poderia ter sido melhor, e aonde você acha que falhou. Segurar sua mão e te consolar, dizendo que você sabe muito bem de todo seu potencial, e não é sempre que dá pra ganhar, por que infelizmente, a vida também é feita de derrotas.
Acordar de manhã cedinho - e de bom humor - sair da cama com o maior cuidado do mundo, ir para a cozinha e preparar um café da manhã simples, mas que dê pra você ter pelo menos 5% de noção do meu carinho.
Escrever algo em um post-it e colocar sem você perceber no bolso da sua calça, ou dentro da sua pasta, ou até mesmo, colado no seu celular para que, quando você veja, dê um sorriso. E o motivo do sorriso, seja eu.
Te abraçar quando você estiver triste, te deixar quieto quando estiver de mau-humor, rir das suas piadas, entrar nas suas brincadeiras, te apoiar nas suas decisões, sejam elas quais forem.
Isso não tá me fazendo bem, entende? Tá me sufocando. Não aguento mais aquela frase do maravilhoso Caio Fernando Abreu, que diz :"Quem procura não acha. É preciso estar distraído e não esperando absolutamente nada. Não há nada a ser esperado. Nem desesperado".
Eu concordo, não há em que discordar. Mas não dá mais, tá me sufocando, tá ocupando espaço demais dentro de mim, essa vontade de cuidar, essa vontade de dar todo o meu melhor e mais puro sentimento.
Então, eu te pergunto: vai demorar muito? Aonde você tá?

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Um Momento De Fantasia

Lembro a primeira vez que eu vi você. Eu tinha acabado de chegar, toda esbaforida, tava frio, mas eu estava com calor, por causa do atraso. O consultório estava cheio, e como não tinha aonde sentar, fiquei em pé encostada na porta.
De repente, você saiu, com uma camisa branca, uma gravata amarela com pontinhos roxos, um blazer e uma calça cinza, e essa sua barba por fazer. Deu um abraço na sua psicóloga e disse algo como "quinta que vem a gente se vê". Em questão de segundos, já tinha decorado sua roupa. Você passou por mim, me cumprimentou com a cabeça e um sorriso, abriu a porta, e foi. E eu fiquei ali, anestesiada com seu terno, gravata e barba.
Não precisou mais nada. Afinal, eu sempre, sempre e sempre me encantei com o pouco, com o que ninguém repara, com os detalhes. Há quem diz que eu sou exigente, que nada nunca está bom. Mas olha, moço, preciso te dizer: Se eu realmente sou assim, você também é realmente especial, por que me acertou em cheio. Não precisou de nenhum esforço, nada além de um "Oi!" e um aceno de mão.
O tempo passou rápido. Ou melhor, não houve tempo. De repente, eu já brincava em te chamar de velhote, e você a me chamar de pirralha e a me ensinar coisas que eu não sabia que existia e me mostrar o desconhecido. Às vezes você era muito quadradinho, e eu te chamava de pai, só pra te ver bravo e segundos depois, tirar toda a sua braveza com um beijo. A sua casa. Ah, a sua casa! Enorme, maior que tudo o que eu já tinha visto, e só você morava nela. Nos finais de semana ou feriados, eu morava lá também, ou brincava de me perder, não sei direito. Tinha medo de ir até a cozinha, e não saber voltar pro quarto, me perder. Mas seria bom se eu me perdesse, certo? Me perderia na sua casa, no lugar aonde você mora, aonde você dorme.De certa maneira, estaria perdida com você. Nesse caso, então, eu amava estar perdida.
E como sempre, você quis me surpreender. Comentou algo como ir pra Itália nas férias, em julho. "Itália, em julho, nós dois?" Foi o que eu disse, e você balançou a cabeça positivamente, com um sorriso nos lábios, o que também me fez sorrir. Nessa hora, enquanto levantei pra te dar um beijo, pensava dentro de mim "somos um casal, somos um casal, somos um casal...".E sorri de novo.
Tá vendo, moço, como você é, de algum jeito, especial? Eu estou sorrindo! S-o-r-r-i-n-d-o! Mais tarde, estávamos nós dois na sua cama, aquela macia e enorme, enquanto você assistia tv e eu te abraçava enquanto sentia um cafuné no topo da minha cabeça. Meus olhos foram ficando cada vez mais sem força, e eu dormi.
Acordei e eu estava na minha cama que é metade da sua e não tinha ninguém abraçado à mim, nem com as pernas entrelaçadas às minhas. Não existia a claridade do seu quarto quando amanhecia, nem sua roupa já separada fora do armário.
Também não existia Itália, nem sorrisos, e principalmente: não existia você. Quer dizer, existir, você existe. Quem não existe, sou eu. Não na sua vida, não na sua casa, nem na sua cama, muito menos num avião rumo à Itália. Não sou sua pirralha, e você, infelizmente, não é o meu velhote.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Sempre querendo o impossível

Sabe o que eu queria agora, meu bem? Sair, chegar lá fora e encontrar alguém que não me dissesse nada, nem me perguntasse nada também, que me oferecesse um colo, um ombro, onde eu desaguasse todo desengano.
Sim. Simples assim.